Tramitam na Câmara dos Deputados vários projetos que buscam
reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos. De inicio, vale ressaltar que a
Constituição Federal, em vigor, no Art. 228 dispõe que são plenamente
inimputáveis os menores de 18 anos. Esta determinação constitucional é
considerada por muitos juristas como cláusula pétrea, e só pode ser alterada
por nova Assembléia Constituinte. Assim, tais projetos são considerados
inconstitucionais.
Mas vamos partir da hipótese de ser possível tal Emenda
Constitucional: há ou não necessidade de diminuir a maioridade penal?
O primeiro equívoco por trás desse debate é supor que o menor
que infringe a lei não é punido. Isso não é verdade. A Constituição Federal de
1988 considera os menores de 18 anos inimputáveis quanto ao Código Penal, mas
sujeita eles a legislação especial: o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), que prevê seis tipos de medidas sócio-educativas para os adolescentes –
da advertência à internação, com privação de liberdade por um período máximo de
três anos. Não há no Estatuto um sistema de impunidade. Pode-se dizer que, na
realidade, são inimputáveis só os menores de 12 anos, pois entre 12 e 18 anos
as punições estão previstas pelo ECA e uma vez que infrinjam a lei estarão
sujeitos à medidas sócio-educativas.
Afirma-se que a internação de três anos é pouco e que as
penas do ECA são muito brandas. Mas para alguém de 15 anos que fique preso até
18 anos, isto significou um sexto de sua vida. Branda? Se um menor de 12 anos
de idade mata seu semelhante, pode ser internado provisoriamente pelo prazo de
45 dias, internação esta que não passa de uma prisão. Sendo semelhante à prisão
temporária do adulto, com a ressalva de que esta não pode ser superior a 10
dias.
O menor responde pelo procedimento, com assistência de
advogado, indicação de testemunhas, senta no banco dos réus, participa do
julgamento – em tudo igual ao maior de 18 anos, mas tendo apenas 12 anos. Não é
só: se for condenado, terá que cumprir pena de
internação – que não passa de prisão – em estabelecimento
educacional – na verdade presídio de menores – pelo prazo máximo de três anos.
É verdade que ao criar as medidas sócio-educativas, o
legislador tentou dar um tratamento diferenciado aos menores, mas foi por ter
reconhecido neles a condição peculiar de pessoas em desenvolvimento. É comum em
adolescentes que períodos de serenidade sucederem-se a outros de extrema
fragilidade emocional e com demonstração freqüente de instabilidade...
Sentem-se imortais, fortes, capazes de tudo... As emoções são contraditórias.
Deprimem-se com fragilidade, passam de um estado meditativo e infeliz para
outro de plena euforia. Somem-se a isso muitas influências negativas do meio
familiar e social. Assim, o adolescente deve receber um tratamento legal
diferenciado.
Outro equívoco é o de que nossa juventude está cada vez mais
violenta. Dos crimes praticados no país só 10% são cometidos por adolescente.
Apenas 1,09% dos jovens têm participação nos crimes mais violentos. A despeito
de serem os jovens a principal vítima da violência. Destarte, caso fosse
adotada, a redução da maioridade penal traria um impacto extremamente reduzido
no que se refere à redução da criminalidade.
Os números se elevam apenas nos casos de tráfico de drogas
(12,08%) e porte ilegal de armas (14,8%). É um erro, porém, o argumento de que
a redução deve acontecer porque os menores são usados pelo crime organizado
para acobertar as suas ações.
Em estudo da Organização Internacional do Trabalho concluiu
que 15 % dos jovens que trabalham no tráfico têm entre 13 e 14 anos. O que faz
supor que não haveria dificuldade em aliciar crianças cada vez menores, a cada
redução proposta na maioridade penal. Reduza para 16 anos e os traficantes recrutarão
os de 14, reduza para 14 e na manhã seguinte os de 13 estarão aliciados como
soldados do tráfico. Assim, rebaixar a idade penal equivale a jogar no mundo do
crime crianças cada vez mais jovens.
Das 57 legislações analisadas, apenas 17% adotam a maioridade
penal menor do que 18 anos. O movimento dos Países é justamente o contrário: a
Alemanha fez retornar a idade penal para 18 anos e criou, inclusive uma
sistemática diferenciada para o tratamento de infratores entre 18 e 21 anos. O
Japão, ao se surpreender com o súbito aumento da criminalidade entre jovens,
ampliou a maioridade penal para 20 anos, por entender que é com educação que se
previne à violência.
Diminuir a idade penal implica estar na contra-corrente da
maioria dos países desenvolvidos. E mais, significa lançar adolescentes em
prisões abarrotadas e dominadas pelo crime organizado. A verdade é que o ECA
não foi completamente implantado, porque onde isso aconteceu os índices de
reincidência caíram. Suas sanções se tornaram verdadeiros castigos, que
revoltam os menores e não recuperam ninguém, a exemplo do que ocorre no sistema
penitenciário adotado para adultos. O melhor caminho é colocar em prática o
Estatuto reeducando e recolocando os mesmos na sociedade.
Não se pode permitir que o Estatuto, que não cumpre suas
políticas sociais básicas; as famílias, que não têm estrutura e abandonam a
criança; os pais que descumprem os deveres do pátrio poder; e a sociedade, que
não exige do Poder Público a execução de políticas públicas sociais, cubram
suas falhas exigindo a redução da maioridade penal.
Baixar a maioridade penal é criminalizar o jovem mais cedo
ainda, incluindo-o no cenário que já se conhece: prisões superlotadas e
ineficazes em suas propostas. A efetivação desse projeto de lei, além de
inconstitucional, não traduz interesse e benéfico para a maioria da população:
sua legitimação é uma farsa e seus efeitos irão recair sobre a classe pobre
cada vez mais excluída do cenário social.
Postado por : Marco Antonio
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