Nas duas últimas semanas teve lugar mais uma cimeira climática em Durban sob a égide da ONU. Poucas esperanças existiam de que, após o falhanço de Copenhaga em 2009 e sem bons prenúncios depois disso, os líderes mundiais chegassem a um entendimento para o combate às alterações do clima. Parodiava um cartoon, e com razão, que o que se conseguiu nos últimos anos não foi reduzir as emissões de carbono (atingiram em 2010 um novo recorde) mas sim as expectativas.
E as expectativas derrotadas são, antes de mais, as de se obter um sucessor para o protocolo de Quioto para o pós-2012, o que tem um enorme significado. Sabemos que este acordo era tímido (redução das emissões em 5%) e assente em mecanismos de mercado que mantiveram tudo na mesma, transformando a poluição em negócio e especulação. No fundo, tratava-se de não enfrentar de frente o problema mas dar-lhe uns paliativos e reforçar a lógica de que onde o mercado falha é preciso criar mais mercado. Mas este protocolo presumia um compromisso que, quer se queira ou não assumi-lo, partia do reconhecimento das profundas alterações que o desenvolvimento do capitalismo, após 1750, tem imposto ao clima e, por esta via, a todos os componentes do sistema climático (atmosfera, biosfera, criosfera, litosfera, hidrosfera) de que dependemos para a nossa subsistência enquanto espécie e para a nossa vida em sociedade.
Abandonar o combate às principais causas das alterações climáticas para tentar mitigá-las é, não só assumir todos os seus impactes dramáticos para as populações e ter a certeza que as gerações futuras viverão num Planeta com menos recursos e mais hostil (a adaptação não conseguirá responder a toda a dimensão dos impactes e terá custos económicos exorbitantes), como deixar o capitalismo seguir o seu percurso de destruição sem qualquer controlo social, sendo também o sinónimo da derrota da democracia.
As expectativas derrotadas são também as de um capitalismo que provou ser irreformável para responder aos desafios da sustentabilidade, entendida como o respeito pelos limites ecológicos e a obtenção de justiça social (na repartição da riqueza, no acesso aos bens vitais e serviços básicos, na melhoria da qualidade de vida). As promessas da tecnologia e da inovação e da maior eficiência inerente ao sistema falham em responder ao sobre-uso de recursos, à sobre-produção de resíduos e ao desperdício generalizado porque enfrentam contradições que o capitalismo encerra dentro de si próprio. O capitalismo precisa de classes para sobreviver como precisa de não ter limites ao crescimento da produção, distribuição e consumo num Planeta que é finito.
A crise financeira e económica que vivemos hoje, o grande argumento para as conversações climáticas desde 2009 não terem seguimento e qualquer relevância mediática, é fruto das contradições do capitalismo. Esta crise é sistémica e é cíclica, tendo nós, no passado, já conhecido várias das suas versões e também das suas consequências destrutivas (como é o caso do ascenso de regimes ditatoriais e das guerras mundiais do século 20). Superar as crises cíclicas do capitalismo e a crise climática (que é contínua pela inércia do sistema climático) implica sair da caverna, relembrando a alegoria de Platão. E sair da caverna significa ver além das sombras do capitalismo e reconstruir a democracia para recuperar o controlo social sobre as nossas vidas e as decisões que as afetam. A economia somos nós e a sociedade será o que quisermos fazer dela.
Se hoje, no mundo ocidental, fazemos parte da geração que vai viver pior que a anterior e a austeridade em curso tal irá garantir, também fazemos parte da geração que tem um conhecimento vasto de como as nossas atividades afetam o clima. Temos, por isso, o poder e a responsabilidade de alterar a nossa relação com o Planeta e de transformarmos a sociedade.
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