quarta-feira, 23 de maio de 2012

As crises do mundo e a libertação pelo Tao


Já escrevi neste espaço que WASHINGTON NOVAES é seguramente nosso melhor jornalista em assuntos ecológico. Seus artigos semanais em O Estado de São Paulo constituem marcos de atualização dos mais diferentes temas concernentes às questões ecológicas. Agora me permito publicar a recensão que fez meu livro escrito em parceria com o canadense MARK HATHAWAY o TAO DA LIBERTAÇÃO. Com inteligência e brilho captou as intuições e os propósitos básicos deste livro de mais de 500 páginas. Muitos que não poderão ler o livro, encontrarão aqui um resumo fiel. Fico agradecido e confirmado em meu trabalho pelas generosas palavras que Novaes encontrou para enfatizar a relevância das visões apresentadas neste livro.
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Leonardo Boff é um erudito. Filósofo, teólogo, autor de dezenas de livros, poucas pessoas, como ele, terão mergulhado tão fundo, com tanta pertinácia, na busca do conhecimento – e do conhecimento da origem, da evolução, do sentido da vida. Tudo isso está presente no livro lançado este ano – O Tao da libertação (Editora Vozes) -, no qual, em parceria com Mark Hathaway  (educador, pesquisador, “ativista ecumênico da ecojustiça”, como é descrito na obra) , traça, em mais de 400 páginas, um roteiro para essa busca. É de perder o fôlego, na medida em que cada página, cada parágrafo, cada frase, é perquiridora, fértil.
Coincidência ou não, o livro é lançado aqui no momento em que uma das mais respeitadas publicações na área da ciência, a revista New Scientist (17/3), em sua matéria de capa, coloca o tema “A questão de Deus – a surpreendente nova ciência da religião”, em que examina o tema “Por que a religião pode sobreviver (ultrapassar) a ciência”.E no momento em que um documento assinado por 20 dos mais respeitados cientistas – todos ganhadores do “Blue Planet”, prêmio alternativo ao Nobel do Meio Ambiente – evidenciam como os nossos modos de viver ameaçam o futuro do planeta e da espécie humana.  A origem e a evolução do universo, o aparecimento da espécie humana, seus descaminhos e as possibilidades de um reencontro com o Tao da Libertação (a procura pela sabedoria) são exatamente o tema desse livro instigante de Boff/Hathaway. Que, ao examinar uma questão central – por que o processo evolutivo criou o ser humano e os dramas que ele produz ? -,  responde de modo semelhante ao que dizia o saudoso psicanalista Hélio Pellegrino: para se ver.
E por que o Tao ? O prólogo do livro responde com os versos: “Existia algo inteiro/antes do céu e da terra./Silencioso e sem forma./Instável e independente./ Sempre em movimento,/ em círculo./ Chamemos-lhe a mãe do mundo./ Não sei seu nome./Chamo-lhe Tao…” Boff e Hathaway complementam: “ O Tao da Libertação é uma procura pela sabedoria necessária para implementar profundas transformações em nossas vidas” . Ele pode ser entendido como “um princípio de ordem que regulamenta o cosmo; é ao mesmo tempo o modo de ser do universo e a estrutura fluídica cósmica que não pode ser propriamente descrita, nas apenas percebida (..) É a sabedoria central do universo, a sabedoria que abrange a essência de seu propósito e de sua direção (..) Transcende, de certa maneira, qualquer filosofia ou religião(…) É uma arte, não é uma ciência exata” (…) É um mistério: nós não podemos fornecer a direção do caminho, não podemos detalhar um mapa preciso”.
Mas seguir nessa busca permitiria encontrar novas maneiras de viver, “nas quais as necessidades da humanidade sejam harmonicamente consistentes com as necessidades e o bem-estar de toda a comunidade de vida da Terra, e com o próprio cosmo (…)Usamos a palavra libertação para nos referirmos a esse processo de transformação”.
É também um livro de esperança, por entender que “o ciclo de desespero e destruição pode ser quebrado”, desde que se admita que o primeiro passo seja “reconhecer que temos de mudar”. Para isso, é preciso repensar uma visão cósmica do universo, de seus 15 bilhões de anos de existência. Saber que a existência da Terra, se condensados esses 15 bilhões de anos em um século, terá começado no ano 70; a vida nos oceanos no ano 73; depois, duas décadas de vida limitada a bactérias unicelulares, que mudaram o universo, a atmosfera, os oceanos, a geologia da Terra – e isso permitiu formas de vida mais complexas. Mas só no ano 93  vieram a reprodução sexual e a morte de organismos singulares. Dois anos depois, chegaram os primeiros organismos milticelulares. Mais um ano, o sistema nervoso. Outro ainda e os organismos vertebrados. Só no ano 98 , depois dos dinossauros e das primeiras plantas floridas, chegaram os mamíferos. Há apenas 12 dias cósmicos “nossos ancestrais se tornaram bípedes” e há 6 dias começaram a usar ferramentas. Há apenas um dia cósmico o homo erectus “conquistou o fogo”. E há doze horas cósmicas surgiu o homo sapiens, os “humanos modernos”.Nessa trajetória, os impactos mais fortes nos ecossistemas vêm ocorrendo há “apenas dois minutos” , com o surgimento da civilização tecnológica. Mas a destruição acelerou-se nos últimos 12 segundos, na segunda metade do século 20.
No entanto, dizem os autores, “tempos de crise podem ser tempos de criatividade”, capazes de superar  as imensas dificuldades. E a “ecologia da transformação” descreve os “processos de inter-relação que devem ser acionados para podermos restaurar a saúde da nossa casa comum, a Terra”. A alternativa principal está nos biorregionalismos, capazes de “conceber uma sociedade baseada em pequenas comunidades locais ligadas por uma rede de relacionamentos fundados na igualdade, na compartilha e no equilíbrio ecológico, em lugar da exploração da natureza. Este modelo procura construir sociedades que são autossuficientes e auto-reguladoras”. E “Deus  vem misturado com todos os processos (as etapas, caminhos e métodos estão descritos no livro), sem perder-se dentro deles: “Tudo não é Deus. As coisas são o que são, coisas. No entanto, Deus está nas coisas (…) Em cada mínima manifestação de ser, em cada movimento, em cada expressão de vida estamos às voltas com a presença e a ação de Deus. Abraçando o mundo, estamos abraçando Deus”.
Com toda a certeza, é um livro que vale a pena ler, seja o que for que se pense.

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