FONTE: www.cartacapital.com.br
Após a finalização da defesa dos réus do julgamento do chamado “mensalão”, suposto esquema de compra de apoio no Congresso durante o governo Lula, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) realizaram a votação das questões preliminares do processo nesta quarta-feira 15. E a nova fase do processo começou acalorada com o ministro Joaquim Barbosa, relator do caso, criticando advogados que o acusaram de atuar com parcialidade. O magistrado também se indispôs com os colegas de toga, que não acataram a proposta de retaliação a esses defensores sugerida por ele.
Barbosa expôs aos ministros que os advogados Antônio Pitombo, Leonardo Avelar e Conrado Gontijo – defensores de Enivaldo Quadrado e Breno Fischberg – fizeram “agressões gratuitas” a ele nas alegações finais em defesa de seus clientes. De acordo com o magistrado, os advogados afirmaram que ele agiu de forma parcial, tomando decisões midiáticas e dando entrevistas adiantando sua intenção de condenar os réus. “Tais afirmações, para dizer o mínimo, ultrapassam o limite da deselegância e da falta de lealdade e urbanidade que se exige de todos os advogados do processo, aproximando-se da pura ofensa pessoal”.
O ministro sugeriu que o STF encaminhasse um ofício à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para abertura de processo disciplinar contra os defensores, mas a ideia foi recusada. Os ministros, com exceção de Luiz Fux, entenderam que os advogados têm licença para usar os meios que considerarem necessários para defender seus clientes, mas alguns destacaram que a OAB já havia tomado consciência dos fatos e abriria processo se achasse correto. “O advogado não pode ter nenhum receio em desagradar o magistrado ou incorrer em impopularidade durante a defesa”, disse Ayres Britto, presidente do STF. “Em rigor o advogado não comete crime na realização da profissão. É claro que há desacato na afronta verbal, o que me parece não ser o caso.”
O posicionamento da maioria da Corte desagradou o relator, para quem a honra do tribunal também foi atacada. “Cada país tem o modelo de Justiça que merece. Se [a Justiça] se deixa agredir, se deixa ameaçar por uma guilda profissional, nunca se sabe qual é o fim que lhe é reservado”.
Após o início acalorado, os magistrados passaram a votar com mais rapidez. Os magistrados negaram, por exemplo, o pedido de inclusão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no processo, feita pelo advogado de Roberto Jefferson. “Não cabe ao tribunal impor ao Ministério Público que denuncie alguém”, disse Barbosa.
Também foi negado um pedido de nulidade processual por parte do réu Henrique Pizzolato. Segundo ele, como a imprensa teve acesso ao seu interrogatório, o processo perdera a validade. “Beira o absurdo, visto que não há sigilo desde a apresentação da denúncia. Mesmo se houvesse apenas o terceiro que forneceu o acesso indevido poderia ser punido”, defendeu Barbosa. O ex-diretor do Banco do Brasil ainda fez outra solicitação no mesmo sentido, apontando suposta incapacidade técnica de peritos federais. O pedido foi negado, pois os ministros entenderam que a formação acadêmica dos funcionários era adequada para perícias contábeis. “A defesa também não especifica a perícia e o laudo que deveria ser retirado dos autos, nem porque queria isso. É uma alegação genérica.”
A defesa de Delúbio Soares, por sua vez, alegou cerceamento de defesa pelo uso de um depoimento de 2008 de Paulo Vieira Albrigo no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, ao qual não teria tido acesso nos autos. O relator destacou que foi colocada uma pessoa para ler em voz alta o depoimento para as defesas. Os advogados pediram a anulação da audiência e a remarcação de uma nova, o que foi negada.
Outra preliminar que deixou Barbosa irritado foi a de Enivaldo Quadrado e Breno Fischberg para que o julgamento do mensalão fosse suspenso até a análise da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) por cerceamento de defesa. “É a bela postulação de Breno para que deixemos nossa soberania”, declarou. A fala fez com que o decano Celso de Mello reforçasse que o Brasil está subscrito ao órgão.
Cai um réu do mensalão
Na mesma sessão, o STF atendeu ao pedido de nulidade da parte do processo que envolve o réu Carlos Alberto Quaglia, dono da empresa Natimar, que teria sido usada para lavar dinheiro do “mensalão”. O caso também foi remetido à primeira instância, deixando o processo com 37 réus. O processo será refeito a partir da defesa prévia ocorrida em 2008. A Defensoria Pública realizou ação por entender que o réu teve seu direito de defesa cerceado, pois seu advogado Haroldo Rodrigues não foi intimado durante o andamento do processo.
O empresário começou a ser defendido pelo advogado Dagoberto Antoria Dufau, que deixou o caso em 2010. Em abril do ano seguinte, o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão, entendeu que o réu não nomeou outro defensor e instituiu a Defensoria Pública da União como seu representante judicial. Rodrigues alegou, porém, que já havia sido nomeado para defender o empresário à época, mas o antigo advogado continuou sendo intimado.
Inicialmente o relator negou o pedido, ressaltando que o novo advogado não poderia ocupar o cargo porque não havia sido registrada a revogação da procuração de defesa aos advogados anteriores. Isso ocorreu em 2010, mas o réu já havia manifestado em depoimento que Dufau não era mais seu representante. “Não dá para negar a má fé do réu, que teve defesa prévia e alegações finais. Isso revela em que o torpe pretende se aproveitar da própria torpeza.”
Mas após a discordância do revisor Ricardo Lewandowski e do acolhimento unânime dos demais ministros ao pedido, Barbosa reformulou sua tese.
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